domingo, 7 de setembro de 2008

Eu sempre a quis, mas eu nunca lhe quis.

Essa foi a frase que um rapaz desalmado disse à sua namorada no momento de "terminar" o namoro com a pobrezinha. Ela, a princípio, nada entendera, mas, depois, estimulada por uma amiga, que também ficara sem entender coisa alguma, pesquisou em um dicionário de boa qualidade o significado da frase. Ficou estarrecida! Também, pudera! O descarado do agora ex-namorado simplesmente dissera a ela que a desejava, mas que não a estimava. Explico mais claramente:

O verbo querer tem várias acepções e predicações. Dentre elas, será verbo transitivo direto, ou seja, verbo que exige um complemento sem preposição, chamado de objeto direto, quando significar desejar (Quem quer, quer algo ou alguém = Quem deseja, deseja algo ou alguém).

Sempre que o objeto direto for um elemento de terceira pessoa, poderá ser representado pelos pronomes oblíquos átonos o, a, os, as. O rapaz disse que sempre quis a namorada, sempre desejou a namorada. O objeto direto a namorada pode ser substituído pelo pronome a: ele sempre a quis; sempre a desejou.

O verbo querer será transitivo indireto, ou seja, verbo que exige um complemento com preposição, chamado de objeto indireto, quando significar estimar. A preposição exigida pelo verbo querer é a prep. a (Quem quer, quer a alguém = Quem estima, estima alguém).

Sempre que o objeto indireto for um elemento de terceira pessoa, poderá ser representado pelos pronomes oblíquos átonos lhe, lhes, desde que seja encabeçado pela preposição a, salvo algumas exceções, que veremos em outra oportunidade. O rapaz disse que nunca quis à namorada, ou seja, nunca estimou a namorada. O objeto indireto a namorada pode ser substituído pelo pronome lhe: ele nunca lhe quis; nunca a estimou (Estimar é verbo transitivo direto).

Ele sempre quis a namorada. Ele nunca quis à namorada. Um sem acento indicador de crase; outro com. Por quê?

Crase é a junção da preposição a com o artigo a ou as ou com pronome demonstrativo (Estudaremos os pronomes demonstrativos em outra oportunidade). Essa junção é representada pelo acento grave ( ` ). O nome do acento, portanto, não é crase, mas sim acento grave.

Quando o verbo querer significar desejar não exige preposição alguma; quando significar estimar, exige a prep. a. O substantivo namorada exige o artigo a. Ocorrerá, portanto, a junção da preposição com o artigo somente quando querer significar estimar. Por isso sempre desejou a namorada = sempre quis a namorada, sem o acento indicador de crase e nunca estimou a namorada = nunca quis à namorada com o acento.

A frase apresentada no início de nosso texto está, portanto, adequada ao padrão culto da língua:

Eu sempre a quis, mas eu nunca lhe quis.

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